Um pouquinho sobre ensino - por Rubem Alves e eu

Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas.

Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do vôo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o vôo.

Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.
                                                                                             Rubem Alves 


Não havia visto até hoje descrição melhor para o que deveria ser o ensino. "As escolas que são asas" deveriam de fato existir. Tive algumas experiências que me mostraram que seria necessário muito trabalho para convencer pais e até mesmo alguns educadores, diretores, de que que as coisas não deveriam ser "quadradinhas". São experiências de alguns anos atrás, não tenho vivido no meio, então não saberia dizer exatamente como está hoje. Mas pelo pouquíssimo que tenho acesso, percebo que as coisas não mudaram muito não. Vamos lá:

1. Minha primeira experiência "fora dos padrões" na época foi em uma escola técnica de contabilidade, onde trabalhei por 2 anos, do final de 1998 à 2000.  E foi ótima, e muito bem recebida. Na verdade os profissionais que lá trabalhavam e coordenavam me deram carta branca para trabalhar do meu modo. Aboli a famigerada prova. Sim, e funcionou. Sempre acreditei nessa forma de ensinar, sem fazer com que o aluno fique em casa decorando, se matando, fazendo cola...afinal, há outras formas de aprender. Cada aula era uma avaliação, ganhavam pontos (sim, não consegui colocar o conceito). A "prova" era de consulta, mas eles poderiam consultar apenas o seu material e quando a prova fosse entregue, apresentar seu material. Tinha que ser o caderno, não podia ser do colega, senão este ficaria sem seus pontos, e não podia ser cópia, somente o original. Com isso, ganhei boas noites de aula, com uma turma - de 41 alunos - sempre atenta e participativa. 
2. Em uma escola de idiomas, de 2001 a 2003. Lá briguei muito para defender o meu modo de trabalho. O diretor da Escola tinha a convicção de que tinha que ter prova sim, e com notas. Ok, as notas venceram, novamente, porque além do diretor os pais ainda não estavam preparados para o conceito. Fazia um acordo com eles, eles faria o "trabalho" sem nenhum tipo de ajuda. Tudo o que soubessem. Depois disso, eles poderiam pesquisar, sendo que as questões que eles haviam consultado deveriam ser marcadas, para que eu pudesse mapear seus pontos fracos. Deu certíssimo. Com os alunos, claro. Não acho que aqui tenha sido uma vitória, pois como disse, briguei muito para trabalhar do jeito que acho que funciona.
3. O ano era 2004, já em SC - uma escola de ensino médio normal e supletivo. Apliquei os mesmos métodos, de cada um com seu material, trabalhos com pesquisa, afinal, se aprende mais decorando ou pesquisando? Pesquisando, claro. Não há aquela cobrança do "eu tenho que saber isso, eu preciso saber isso". Resultado: Fui chamada para uma conversa porque os pais dos alunos não gostaram da ideia dos filhos não fazerem uma prova para avaliação e reclamaram de suas "notas baixas". Detalhe: as notas baixas foi porque os queridinhos não faziam nada em aula. Mas os pais não entenderam isso. Não deu certo e fui demitida.

De tudo isso tirei várias coisas. Uma delas é a certeza de que eu fiz a coisa certa, fiz o que acreditava e o que acredito ser certo. Uma pessoa não pode ser obrigada a aprender sobre assuntos que ela jamais vai conseguir aprender. Sabemos disso. Temos é que dar condições para que eles se interessem pelo assunto e busquem saber , conhecer sem o peso da responsabilidade de "ter que saber". Outra coisa é sobre "avaliações". Os alunos não podem ser avaliados somente no momento da "prova". Jamais. São seres em constante aprendizado, ele pode ter aprendido, assimilado um determinado assunto na aula e na hora da "prova" esquecer, sob a pressão de ter que se dar bem e ter notas altas. Prefiro que meus alunos leiam, pesquisem, aprendam dessa forma do que apenas decorem alguns pontos para se dar bem na prova e pronto, logo depois esquecer. Portanto:

"Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado."

 

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